Ao longo dos últimos anos, a Suécia vem se afirmando como reduto de excelência dentro do cenário independente mundial. Nomes como The Knife, Jens Lekman e Peter, Bjorn and John ganham cada vez mais destaque na imprensa musical de todo o planeta, enquanto novas promessas – bandas como I’m From Barcelona e Loney, Dear – fazem a festa da região mais musical da blogosfera.
José González, 28, maior expoente desta safra, prefere, no entanto, não se vincular a esta movimentação. “A Suécia é um país pequeno, com cidades pequenas, então você acaba trombando outros músicos, mas não faço música com eles. Temos aqui um bom ambiente para se fazer música, mas não acredito que eu seja parte de nenhuma cena”, diz, de sua casa em Gotemburgo.
Filho de argentinos, González conta que cresceu escutando música latina e brasileira. “Comecei a tocar violão influenciado por Silvio Rodriguez e gente como Caetano Veloso, Chico Buarque e João Gilberto”. Aprendeu os primeiros acordes tirando canções dos Beatles e clássicos da bossa nova e, depois, dedicou-se ao violão clássico e teve bandas de rock.
“Acho que a mistura do aprendizado do violão clássico com a audição do indie rock americano me trouxe para onde estou hoje em dia”. Mais precisamente: Veneer, seu primeiro álbum, lançado na Europa em 2003, e dois anos depois nos EUA, levou-o ao sétimo lugar das paradas inglesas, foi disco de ouro na Suécia, teve uma das músicas como trilha de uma propaganda de televisores e outra embalando o episódio de encerramento da segunda temporada da série The O.C. Agora, o trabalho chega às lojas brasileiras, acompanhando alguns shows que o músico deve fazer no país no início de junho.
O sucesso de Veneer pegou González de surpresa, principalmente por se tratar de um disco totalmente gravado em casa, apenas com o auxílio de um computador e um par de microfones. “Minhas expectativas iniciais eram muito baixas. A maior parte das coisas que escuto não vendem muito, então achei que seria igual”, conta. “Gravei o disco na minha cozinha. É bem lo-fi”.
Para os shows brasileiros, os fãs podem esperar basicamente o que se escuta em seu primeiro álbum: “é um show de violão e voz”. Além das músicas de Veneer, Gonzáles deve mostrar algumas composições de seu próximo álbum, que deve manter as raízes lo-fi, mas longe da cozinha. “Agora tenho um escritório-estúdio que posso utilizar sem ter que pensar na louça que tenho que lavar enquanto gravo”.
José González
Veneer – três estrelas e meia
Folk como le gusta
A nova onda revivalista do folk revelou alguns dos nomes mais interessantes desta década, da complexidade épica pastoral de Joana Newson ao experimentalismo colaborativo do Sunburned Hand of the Man, só para citar duas extremidades opostas do eixo em que, lá no meio, reside o som mais ortodoxo praticado por González. Neste panorama, cabe ao sueco filho de argentinos posar como herdeiro natural da coroa de Nick Drake, mestre da vertente mais introspectiva e melancólica do gênero, principalmente pelas espirais quase mântricas de violões dedilhados e a atmosfera etérea que permeia este seu primeiro trabalho, lançado no Brasil com quatro anos de atraso. Há palmas em “Lovestain”, percussão em algumas outras canções e um trompete na faixa de encerramento, “Broken Arrow”, mas, fora isso, não espere aqui nada mais que voz e violão. Tudo devidamente gravado em casa, fato que dá ao disco um saudável aspecto lo-fi. “Remain” escancara a influência brasileira na música do cara – imagine se Devendra Banhart tivesse escolhido João Gilberto, e não Caetano Veloso, como ídolo brazuca -, enquanto o filé mignon do disquinho é “Heartbeats”, versão para um electro-pop arrasa-quarteirão dos conterrâneos The Knife, reduzido aqui a uma envolvente canção para ouvir a dois.
José González - três estrelas e meia
Sesc Vila Mariana – SP
A difícil arte de ser simples
Com som perfeito e iluminação adequada, o teatro do Sesc Vila Mariana devidamente lotado em seus mais de 600 assentos mostrou-se o lugar certo para receber a atmosfera intimista e a timidez simpática levadas ao palco pelo sueco José González. O clima se refletia na platéia, reverentemente silenciosa por toda a apresentação. Ao vivo, fica claro o truque do cara: a simplicidade encantadora das canções de Veneer – primeiro disco de González -, calcadas em repetições hipnóticas de fraseados no violão, esconde um músico que esbanja técnica e inventividade, trabalhando com rigidez nórdica em afinações variadas e explorando possibilidades percussivas do instrumento. E a voz ainda é boa, bem colocada, menos João Gilberto, mais Nick Drake. Aos poucos, algumas músicas novas são apresentadas, e parecem ainda melhores que as antigas. Mas a parte mais suculenta do show são as versões para músicas alheias, quatro ao todo. “Teardrop”, do Massive Atack, precedeu o bis, que trouxe mais três: “Hand on Your Heart” (Kylie Minogue), a melhor; o sucesso “Heartbeats”, recebido com entusiasmo; e, finalizando, “Love Will Tear Us Apart” (Joy Division), no momento da noite mais próximo a um show de rock. Um banquinho, um violão, um copo de vinho e um grande show: ah, se o “som do barzinho” fosse assim.
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